domingo, 4 de julho de 2010

Carona

Carona



Apressou o passo enquanto a chuva apressava suas gotas
Fechou melhor o casaco e se abraçou
Aquela rua nunca pareceu tão comprida
Aquela noite nunca pareceu tão vazia

- A senhora deseja que eu lhe acompanhe? - Uma voz grave de um homem do outro lado da rua lhe atingiu, não sentiu medo, na verdade, alívio, pareceu ruim e errado estar naquela rua à noite e só, ele era só um casaco longo com um guarda-chuva na luz de meio-fio.

- Sim, gostaria, esta chuva está me matando.

Caminharam em silêncio por alguns passos, ele tinha cheiro de livro novo, suas mãos eram firmes e seguras e não soube dizer por quê teve vontade de ir mais devagar.


-Não acha perigoso ser acompanhada por estranhos? Já está tarde afinal e essa sempre foi uma cidade perigosa.

- Acho mais perigoso os conhecidos, não creio que o senhor possa me fazer mal.

- Não crê? A senhora não me conhece.

- Não sei te explicar de outra forma, mas é como se ao descer essa rua nada mais pudesse me fazer mal, acho que já não me importo mais com nada,

- Exceto com a chuva?

- Exceto com a chuva. – Sorriu, era estranho se sentir familiarizada daquela forma, como se tudo fosse normal e corriqueiro, e como, sem a chuva lhe atrapalhando só queria andar um pouco mais.

- A senhora sabe aonde está indo?

A pergunta lhe tirou da nostalgia e lhe embaraçou um pouco, na verdade, olhando bem, não conhecia aquele caminho, e nem para onde estava indo, abriu os olhos num sobressalto, como se acordasse de um sonho que caísse, mas permanecia caindo.

- Aonde está todo mundo? Aonde está o caminho para casa?
- Então a senhora não sabe?
-O quê eu deveria saber? - Sua voz saiu num sobressalto, o medo de saber venceria a vontade de perguntar.

- Não são as pessoas que sumiram, e sim a senhora que optou pelo sumiço delas, você acaso não sabia que está morta?
- Morta? Eu? Mas isso é ridículo!
- Se não está, prove, olhe para trás.

Temerosa e um tanto quanto resoluta, mas convicta que se a morte tivesse lhe achado ela teria em algum momento notado, parou seu caminhar tropego e olhou as suas costas.
Dizem que os olhos são os últimos órgãos a responder ao corpo, mas ela se olhou a passos atrás em uma rua escura, aceitando a morte de olhos abertos,pode-se lutar com a vida, mas com a morte, é melhor aceitar sua carona.

4 comentários:

  1. prefiro ter toda vida
    a vida como inimiga
    a ter na morte da vida
    minha vida decidida

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  2. na verdade o verso é

    prefiro ter toda vida
    a vida como inimiga
    a ter na morte da vida
    minha sorte decidida

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  3. Senti uma sensação de medo. Acho que fiquei assustado quando disse quem era quem a acompanhava.

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